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NATO VAI SUBSTITUIR NORTE-AMERICANOS NO IRAQUE

NATO prepara para a Primavera os maiores jogos de guerra na Europa dos últimos 25 anos

2020-01-20

A NATO está em pé de guerra, a sua verdadeira natureza. Por ordem de Trump, que já criou sigla para o efeito – NATOME – a aliança está a preparar a substituição dos soldados norte-americanos a expulsar do Iraque por militares de países membros, que ficarão sujeitos ao caos regional criado pelas práticas norte-americanas. Enquanto isso, e porque não pode haver distracções com a “ameaça russa”, o Estado-Maior atlantista prepara para a Primavera os maiores jogos de guerra na Europa dos últimos 25 anos.

Manlio Dinucci, Il Manifesto/O Lado Oculto

De acordo com um velho projecto conhecido desde 2013, a Alemanha conseguiu convencer o presidente Trump a colocar tropas europeias no Médio Oriente sob comando da NATO. A aliança, por seu lado, encara a situação como uma oportunidade para se instalar na região Indo-Pacífico e transformar-se numa organização mundial, apoiando-se, designadamente, na questão de Taiwan. Para preservar a credibilidade, a NATO deve mostrar que conserva a sua força perante a Rússia e vai organizar as gigantescas manobras “Defender Europe 20”.

NATOME: eis como Donald Trump, o presidente que se gaba do talento para criar acrónimos, já baptizou a instalação da NATO no Médio Oriente, que requisitou por telefone ao secretário-geral da aliança, Jens Stoltenberg. Este aceitou imediatamente que a NATO tenha “um papel reforçado no Médio Oriente, particularmente em missões de treino”. Stoltenberg participou, entretanto, na reunião de ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia sublinhando que a UE deve continuar ao lado dos Estados Unidos e da NATO porque, “ainda que tenhamos feito enormes progressos, o Daesh (Isis ou Estado Islâmico) pode regressar”. Os Estados Unidos tentam, desta maneira, implicar os aliados europeus na situação caótica criada pelo assassínio do general iraniano Soleimani em Bagdade, ordenada pelo próprio Trump.

Troca por troca

Depois de o Parlamento iraquiano ter deliberado expulsar os mais de cinco mil soldados norte-americanos presentes no país, juntamente com milhares de mercenários do Pentágono, o primeiro-ministro Abdul Mahdi pediu ao Departamento de Estado o envio de uma delegação para definir os procedimentos de retirada. Os Estados Unidos – respondeu o Departamento de Estado – enviarão uma delegação “não para discutir a retirada das tropas mas o dispositivo adequado de forças no Médio Oriente”; acrescentou que Washington está prestes a estabelecer um acordo sobre “o reforço do papel da NATO no Iraque, correspondendo ao desejo do presidente de que os aliados partilhem a carga em todos os esforços para a nossa defesa colectiva”.

O plano é evidente: substituir, no todo ou em parte, as tropas dos Estados Unidos no Iraque pelas dos aliados europeus, que se verão nas mais arriscadas situações, como demonstra o facto de a própria NATO, depois do assassínio de Soleimani, ter suspendido as missões de treino no país.

Europa em estado de guerra

Além da frente meridional, a NATO está mobilizada na frente oriental. Para “defender a Europa da ameaça russa” tem vindo a preparar as manobras “Defender Europe 20”, que darão origem, em Abril e Maio, à maior mobilização de forças militares norte-americanas na Europa dos últimos 25 anos. Vinte mil soldados, entre os quais alguns milhares da Guarda Nacional oriundos de 12 Estados dos Estados Unidos, serão deslocados para a Europa, onde se juntarão aos nove mil já estacionados – num total de aproximadamente 30 mil. Ao seu lado estarão sete mil soldados de 13 países da NATO e de dois parceiros, a Geórgia e a Finlândia. Além dos armamentos que viajarão do outro lado do Atlântico, as tropas norte-americanas utilizarão 13 mil tanques, canhões, blindados e outros veículos militares de “arsenais pré-posicionados” norte-americanos na Europa. Os comboios militares com veículos blindados percorrerão quatro mil quilómetros através de 12 estradas, operando com aviões, helicópteros, drones e unidades navais. Paraquedistas norte-americanos da 173ª Brigada e os italianos da Brigada Folgore saltarão em conjunto na Letónia.

As manobras “Defender Europe 20” têm ainda um outro aspecto relevante na estratégia dos Estados Unidos e da NATO resultante do agravamento da crise no Médio Oriente. O Pentágono, que no ano passado enviou mais 14 mil soldados para esta região, está em vias de colocar aqui algumas forças que participam no exercício de guerra na Europa: quatro mil paraquedistas da 82ª Divisão aerotransportada e 4500 marines, entre os quais os do navio anfíbio de assalto USS Bataan, usado anteriormente como prisão clandestina norte-americana para torturar alegados “terroristas” em águas internacionais. Antes ou depois das manobras na Europa poderão ser enviadas ainda outras forças para o Médio Oriente. O Pentágono sublinha, porém, que a planificação do “Defender Europe 20” pode ainda vir a ser alterada. Por outras palavras, 30 mil soldados norte-americanos vão treinar-se para defender a Europa de uma agressão russa. Um cenário que não poderá acontecer realmente, designadamente porque no confronto não seriam utilizados tanques mas sim mísseis nucleares; no entanto, é um cenário útil para semear a tensão e alimentar a ideia do inimigo.



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