CHINA E CUBA EXPLORAM PETRÓLEO NAS ÁGUAS DA ILHA

2019-04-28
F.William Engdahl, New Eastern Outlook/O Lado Oculto
Como tem vindo a ficar cada vez mais claro que as mal sucedidas acções da administração Trump para mudar o governo na Venezuela têm também a ver com a enorme presença financeira chinesa neste país, as recentes notícias de um grande êxito chinês em águas cubanas irão claramente aprofundar as tensões geopolíticas. E não apenas na Venezuela, na Guiana e no Brasil.
A CNPC, uma empresa subsidiária da Great Wall Drilling, começou a explorar petróleo nas águas offshore de Cuba em joint-venture com a empresa petrolífera estatal cubana, a Cuba Petroleum Company (CUPET). A notícia foi divulgada em 16 de Abril pela agência oficial chinesa Xinhua. A Great Wall Drilling está envolvida na prospecção de petróleo em Cuba desde 2005 e este é o resultado mais promissor registado até ao momento. A avançada tecnologia de perfuração utilizada pela CNPC abriu perspectivas, pela primeira vez, de uma grande exploração de petróleo em águas territoriais cubanas.
A notícia surge no momento em que as sanções impostas por Washington pretendem impedir a Venezuela de ter acesso aos lucros da exploração do seu petróleo. E também numa altura em que o governo de Nicolás Maduro continua a fornecer petróleo a Cuba, apesar das sanções, prevendo-se, no entanto, que essa actividade venha a ser afectada em termos de riscos e segurança.
Em 21 de Abril, o conselheiro de segurança nacional dos Estados Unidos, John Bolton, anunciou o alargamento das sanções contra Cuba incluindo medidas inéditas que permitem interpor acções judiciais nos tribunais norte-americanos contra interesses estrangeiros que usem propriedades nacionalizadas pelo governo de Cuba. Não é ainda claro o volume de prejuízos que esta decisão pode provocar em Cuba, mas tem como objectivo desencorajar o investimento estrangeiro no país.
Cuba é muito conhecida pela solidariedade militar em defesa da independência de outros países e também pelo envio de milhares de médicos em ajuda internacionalista, designadamente à República Bolivariana da Venezuela. O que não é tão conhecido, e talvez seja uma das razões por detrás das declarações de Bolton, é a presença da China nos dois países.
A presença chinesa em Cuba
Os valores dos investimentos e dos empréstimos da China em Cuba não são conhecidos na sua globalidade. Mas a verdade é que Pequim tem vindo a aumentar a sua presença na nação caribenha desde o colapso da União Soviética.
Os investimentos chineses têm sido diversificados, direccionados para diversas áreas-chave do sector da economia aberto a uma maior liberalização. Na área do comércio, por exemplo, só nos últimos dois anos a China vendeu autocarros Yutong, camiões Sinotruk, tractores YTO, automóveis Geely, aparelhos domésticos Haier e 100 locomotivas ferroviárias.
A Huawei tem vindo a instalar hotspots de internet na ilha e existem negociações em andamento para a China investir um volume de 600 milhões de dólares norte-americanos numa joint-venture para reactivar a empresa de processamento de níquel Las Camariocas, que a União Soviética deixou por concluir. Cuba tem as terceiras maiores reservas de níquel do mundo.
Em 2017, a Haier chinesa inaugurou uma fábrica de computadores em território cubano com uma capacidade de produção anual de 120 mil laptops e tablets
Um terminal de contentores para navios foi erguido em Santiago de Cuba através de um empréstimo chinês para o desenvolvimento no valor de 120 milhões de dólares.
Pequim transformou-se no maior parceiro comercial de Cuba, e também o maior credor de Havana. A parte cubana importa grandes quantidades de arroz da China e recebe anualmente milhares de turistas chineses, actividades que representam cerca de dois mil milhões de dólares. Açúcar e níquel são os dois principais produtos cubanos importados pela China. A balança comercial pende para o lado chinês.
A descoberta de importantes reservas petrolíferas em águas territoriais cubanas irá aumentar significativamente a presença chinesa em Cuba; ao mesmo tempo poderá compensar a redução de remessas de petróleo venezuelano provocada pelo cerco e as sanções impostas pelos Estados Unidos contra a indústria petrolífera da Venezuela.
Expansão nas Caraíbas?
A China é o principal credor de Cuba e também na Venezuela – podendo ambas as dívidas ascender a 60 mil milhões de dólares. O petróleo venezuelano está claramente no centro deste relacionamento, embora empresas chinesas estejam igualmente a explorar outros importantes recursos da Venezuela, designadamente o ouro e o coltan.
A China pronunciou-se activamente em defesa da legitimidade do governo de Nicolás Maduro a partir do momento em que os Estados Unidos lançaram a tentativa de golpe de Estado com a declaração de Juan Guaidó como “presidente interino”. Esta posição de Pequim reflecte um envolvimento pouco habitual, uma vez que a China raramente se pronuncia sobre situações que dizem respeito a ocorrências políticas nos países com os quais negoceia.
Guiana
Pequim aumentou também a sua presença na vizinha Guiana a partir de 2018, quando esta pequena ex-colónia britânica aderiu à iniciativa “Rota e Cintura”, também considerada a nova Rota da Seda chinesa.
A circunstância demonstra que este projecto chinês, apresentado pelo presidente Xi Jinping em 2013 no Casaquistão, está a adquirir dimensões mais amplas que as originais. O projecto inicial foi proposto como a ligação de toda a Eurásia do Índico ao Atlântico através de uma rede terrestre e marítima formada por portos de águas profundas e ferrovias de alta velocidade. A iniciativa tem vindo a adquirir perspectivas globais, o que começa a causar perturbações em Washington.
Empresas chinesas estão a construir, com investimento chinês, uma ligação rodoviária de Manaus, no Norte brasileiro, através da Guiana e dando ao Brasil um acesso muito mais favorável ao Canal do Panamá, cortando grandes distâncias na rota de navegação. Existem igualmente negociações no sentido de a China construir um porto de águas profundas no Norte da Guiana, que ficará ligado à estrada para a região amazónica do Brasil, na fronteira com a Venezuela, o que permitirá escoar riquezas minerais que ainda estão por explorar. O novo porto na Guiana permitirá também um movimento mais eficiente de navios da Amazónia para o Canal do Panamá e daí para a China.
E o Panamá…
Acrescentando à crescente presença económica de Pequim em Cuba, na Venezuela e na Guiana as acções que tem vindo a desenvolver no estratégico Canal do Panamá começam a perceber-se as preocupações de Washington com esta nova dinâmica regional.
Em 2016, o Landbridge Group da China comprou o porto da Ilha Margarita no Panamá, na zona de comércio livre de Colón, o maior do lado atlântico do Canal. A iniciativa permitiu à China um acesso muito favorável a um dos mais importantes centros de distribuição de mercadorias do mundo. Através da empresa estatal Communication Construction Group, hoje a maior sociedade de engenharia e infraestruturas do mundo, Pequim promoveu uma grande expansão da utilização do porto adquirido.
O grupo chinês Hutchinson Whampoa assumira já em 1997 o controlo dos portos de Balboa e Cristóbal, construídos pelos Estados Unidos no Panamá, através de um contrato com duração de 50 anos. A Hutchinson pertence hoje à Cheung Kong Holdings, da família do milionário chinês Li Ka Shing.
Em 2017, o Panamá provocou um choque em Taiwan e em Washington ao retirar o seu anterior reconhecimento da Formosa em favor de Pequim. Já em Abril deste ano, o presidente do Panamá, Juan Carlos Varela, visitou Pequim para negociar formalmente a adesão do seu país ao projecto chinês “Rota e Cintura”. O presidente chinês, Xi Jinping, visitara o Panamá em Dezembro de 2018, ocasião em que Pequim colocou este país no topo das suas prioridades. Actualmente, os produtos chineses são já os segundos em volume a atravessar o Canal do Panamá, a seguir aos dos Estados Unidos.
Além do controlo chinês sobre alguns dos portos de contentores mais importantes do Panamá, entre eles o da Ilha Margarita, a China já propôs a construção de uma ligação ferroviária de alta velocidade no valor de 4100 milhões de dólares norte-americanos entre a Cidade do Panamá e a fronteira com a Costa Rica, a integrar na rede “Rota e Cintura”.
Enquanto esta dinâmica se desenvolve, o presidente mexicano, Andrés Lopez Obrador, manifestou a intenção de começar a negociar a integração do seu país no mesmo projecto.
A existência destes novos dados estratégicos tornam mais claras as razões pelas quais Washington tem vindo a reactivar a sua velha Doutrina Monroe no “quintal das traseiras”. Ora o que falta aos Estados Unidos é a opção por alternativas económicas positivas que proporcionem o desenvolvimento de infraestruturas essenciais dos países da América Central e do Sul. Falta, pois, uma alternativa à velha, radical e actual política da canhoneira. Quem sabe se, com ela, o clima na região não se tornaria bastante mais favorável à cooperação com Washington.