O CONTRATO ENTRE GUAIDÓ E OS SEUS MERCENÁRIOS PARA MATAR MADURO
2020-05-15
Tomar o aeroporto de Caracas, capturar o presidente Nicolás Maduro com o objectivo de o enviar para os Estados Unidos – ou matá-lo, em alternativa – era o objectivo principal da operação terrorista de 3 de Maio contra a Venezuela, de acordo com as confissões dos mercenários – entre eles dois ex-membros das forças especiais dos Estados Unidos – capturados na ocasião. A acção está expressa como “objectivo principal” no contrato estabelecido entre o chefe fascista Juan Guaidó, auto-intitulado “presidente interino”, e a empresa de mercenários Silvercorp, da Florida, igualmente prestadora de serviços ao actual presidente dos Estados Unidos. Conheça os meandros do contrato e os métodos de gestão pretendidos por Guaidó, o “presidente” da Venezuela reconhecido por numerosos países da União Europeia, entre os quais o governo da República Portuguesa.
Misión Verdad/O Lado Oculto
Foi dado a conhecer o conteúdo completo do contrato assinado por Juan Guaidó, Sergio Vergara e J.J. Rendón com a assinatura de mercenários norte-americanos da empresa de segurança Silvercorp, a cargo do ex-militar dos Estados Unidos Jordan Goudreau.
O ministro de Comunicação venezuelano, Jorge Rodríguez, em conferência de imprensa no Palácio de Miraflores, em Caracas, expôs pormenorizadamente as cláusulas do contrato e explicou os seus alcances e objectivos, entre os que se incluía a eliminação física do presidente Nicolás Maduro e de altas autoridades do Estado venezuelano.
Com as provas reveladas até agora fica estabelecido que Juan Guaidó tinha um conhecimento detalhado do contrato que assinou, com o objectivo de impulsionar a intervenção mercenária contra a Venezuela que encalhou nas costas do país em 3 de Maio.
Embora o deputado auto-proclamado “presidente interino” tenha negado qualquer vínculo ao sucedido, através de comunicados e declarações evasivas, o seu assessor J.J. Rendón confirmou a veracidade do contrato, enquanto, por outro lado, o conhecimento de um novo ficheiro áudio revelou o diálogo entre Goudreau e Guaidó no momento de fechar o acordo.
4. Projecto Resolução Operação
a. Os Assessores do Provedor de Serviços orientarão e ajudarão o Grupo Parceiro no planeamento e execução de uma operação para capturar/deter/remover Nicolás Maduro (doravante o “Principal objectivo”) remover o Regime actual, e instalar o Presidente Venezuelano reconhecido Juan Guaidó. Esta operação é referida, doravante, como “Projecto Resolução Operação”. O Projecto Resolução Operação é encomendado unicamente pela Administração. O Projecto Resolução Operação é sensível ao tempo. Para isso, o Grupo de Acção deverá iniciar o Projecto Resolução Operação. No caso de Nicolás Maduro renunciar ao poder como Presidente, ser removido por outro grupo ou governo, ou se passar o poder a outra pessoa antes que o Projecto Resolução Operação venha a ocorrer, o Provedor de Serviços continuará os serviços durante o período.
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O conteúdo do contrato assinado em Outubro de 2019 revela que a eliminação física do presidente Nicolás Maduro e dos altos dirigentes do Estado venezuelano era o primeiro objectivo dentro de uma operação que tinha como propósito geral a ocupação militar prolongada do país nas mãos de um exército privado de mercenários, eventualmente com o envolvimento directo de tropas regulares dos Estados Unidos.
O contrato estabelece que a presença da Silvercorp no país seria de 495 dias ininterruptos, actuando como “força de segurança” do governo ilegítimo de Guaidó com a finalidade de “estabilizar o país”.
Embora a operação para “capturar / deter / eliminar Nicolás Maduro, eliminar o actual Regime e instalar o reconhecido presidente venezuelano Juan Guaidó (sic)” fosse o objectivo primordial, Guaidó comprometia-se a honrar os pagamentos mensais à Silvercorp inclusive se o legítimo presidente venezuelano, por outras circunstâncias, fosse afastado do seu cargo antes da incursão armada.
O pagamento dos serviços contratados poderia ser realizado em barris de petróleo ou recorrendo a investidores privados. A Silvercorp comprometia-se a criar uma ponte entre Guaidó e os investidores, cobrando uma taxa de juros de 55% que devia ser paga à empresa de mercenários de Goudreau.
Seguindo estas cláusulas, a Silvercorp actuaria como um intermediário financeiro entre o governo fake de Guaidó e os capitalistas interessados em obter um rendimento económico com as operações ilegais dos mercenários em território venezuelano. Consequentemente, o contrato era também uma aventura financeira e a carta de navegação do neoliberalismo armado. A empresa de Goudreau iria transformar-se na rutilante administradora de contratos com empresas petrolíferas, mineiras e industriais que deviam recorrer aos os serviços da Silvercorp para operar na Venezuela de “forma segura”.
Esta relação entre empresas transnacionais e as empresas mercenárias privadas é comum na Colômbia, Iraque ou Afeganistão, onde as corporações contratam empresas de segurança privada para proteger os seus negócios em situações de conflito armado de baixa ou média intensidade. O negócio da guerra.
Sempre acima da Constituição
Segundo o contrato, a Silvercorp actuaria de mãos dadas com o governo fake de Juan Guaidó, e por cima das instituições de defesa e segurança nacional constantes da Constituição da República Bolivariana da Venezuela, como por exemplo a Força Armada Nacional Bolivariana (FANB).
O poder de Goudreau seria supraconstitucional e somente prestaria contas a Guaidó. Estaria por cima da FANB, dos serviços de inteligência e da polícia, exercendo uma capacidade de actuação unilateral em diversos sectores da atividade militar.
Nesse sentido, as cláusulas do contrato implicam a dissolução da República Bolivariana, das suas instituições públicas e do sistema de garantia de direitos humanos estabelecido na Carta Magna do país. A FANB seria substituída por um exército privado de ocupação e os responsáveis dos poderes públicos passariam a ser designados como “forças hostis”.
O contrato destaca que figuras como Diosdado Cabello, Nicolás Maduro e os seus “partidários” seriam declarados como tais, o que em termos concretos implicava a perseguição e captura de todos os cargos públicos e institucionais do Estado venezuelano.
Tratava-se de uma operação de terra queimada onde autarcas, governadores, juízes, promotores, ministros e outras autoridades designadas como “chavistas” passariam a ser capturadas, perseguidas ou assassinadas. Aplicando estas técnicas próprias do terrorismo de Estado, o governo fake de Guaidó reorganizaria o Estado venezuelano em todas as suas unidades.
O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, apresentando o contrato terrorista
Aproveitando-se do estado de sítio de facto e com os terroristas da Silvercorp nas ruas do país iria concretizar-se o desmantelamento da República Bolivariana, o desaparecimento físico do chavismo como força política e institucional, e seriam criadas as condições para o leilão de empresas públicas em benefício das transnacionais.
Porta aberta a tropas norte-americanas
É catastrófico (e também inédito) que um contrato privado com uma empresa mercenária seja a fonte da dissolução da Venezuela tal como a conhecemos. Isto não tem comparação na história republicana do país; e a nível mundial há que apurar se existem exemplos afins.
O contrato assinado por Guaidó estabelece uma reorganização do Estado e uma nova estrutura do ordenamento jurídico venezuelano. Por exemplo, uma das cláusulas estabelece a instalação de um Comando Estratégico Venezuelano (VSC, na sigla em inglês), perante o qual responderia a Silvercorp. Esse suposto Comando, que teria um cargo de comando então ainda não definido, mas certamente da Silvercorp, autorizaria as operações militares ilegais contra as “forças hostis”, as manobras operacionais para conter distúrbios e manifestações e de que forma seriam realizadas as detenções de pessoas identificadas com o chavismo.
Pela lógica, o texto assume que uma vez derrubado o governo constitucional venezuelano haveria manifestações e distúrbios contra o golpe de Estado. Para amenizar a perseguição ilegal e assassina contra o movimento de contragolpe chavista nas ruas, a Silvercorp designa todas as expressões de oposição ao governo fake de Guaidó como “forças hostis”.
Nesta designação incluem-se o Hezbollah, o grupo guerrilheiro colombiano ELN (Exército de Libertação Nacional), as “forças ilegítimas venezuelanas”, as milícias (colectivos) e a própria FANB. Esta cláusula encaixa-se perfeitamente no discurso sobre a “presença do Hezbollah na Venezuela” divulgado pelos falcões norte-americanos, especialmente por Mike Pompeo e o chefe do Comando Sul, pelo que é evidente que a Silvercorp poderia associar-se a tropas dos Estados Unidos - com a Força Aérea e o Comando Sul (distribuído pelo Pacífico com diversos contratorpedeiros, um deles especificamente “emprestado” pela Quarta Esquadra) para perseguir supostos “factores terroristas”.
O reconhecimento diplomático e ilegal de Juan Guaidó como “presidente interino” bastaria para “legalizar” as operações da Marinha norte-americana, da Força Aérea e o desembarque de forças especiais no território venezuelano para colaborar na eliminação de supostos alvos do Hezbollah, do ELN e de outras “forças hostis”. Inclusivamente determinaria as condições políticas para a instalação de bases militares norte-americanas de forma permanente e a celebração de tratados ilegais que permitam as actividades das agências norte-americanas como a CIA, o FBI ou a DEA, tal como aconteceu na Colômbia com o “Plano Colômbia” e no México com a “Iniciativa Mérida”.
Em termos gerais, o contrato abria a porta para uma intervenção convencional norte-americana, unilateral e à margem do Conselho de Segurança das Nações Unidas, para controlar o poder perante uma revolta militar e civil generalizada após o golpe de Estado, pois o chavismo ainda conservaria estruturas militares, policiais e populares para enfrentar os invasores.
O fascismo puro e duro
O contrato também dissolve a legislação venezuelana em termos penais e suspende de facto todas as instituições encarregadas de zelar pela protecção dos direitos elementares da população.
A Silvercorp estabelece que, através da unidade irregular OSC, e por ordem unilateral do suposto VSC, poderiam realizar-se detenções de pessoas, registo de espaços e residências, capturas e outras medidas de repressão a “forças hostis” ou presumivelmente a colaborar com as “forças aliadas do antigo regime”. Nesse sentido, estabelece quais serão os “delitos” do pós- golpe: ser chavista, funcionário, polícia ou militar que não se renda diante dos terroristas da Silvercorp “mandados” por Guaidó, seu “Comandante Chefe” segundo o contrato.
A cadeia de comando terrorista
Estas detenções seriam realizadas de forma ilegal quando houvesse “suspeitas razoáveis”, e não estariam sujeitas a qualquer mandato institucional; portanto, as pessoas detidas e perseguidas não contariam com instituições como a Procuradoria Geral ou o Poder Judiciário para se defender. O exército de mercenários Goudreau seria procurador, tribunal e carrasco ao mesmo tempo.
Para massificar estas técnicas de terrorismo de Estado, o contrato outorga uma suposta legalidade ao assassínio de civis inocentes depois de os acusar de pertencerem às “forças hostis” descritas no documento. Acusar um responsável de um Comité Popular ou dirigentes comunitários dos bairros de Caracas de serem “colaboradores do ELN ou do Hezbollah”, de “obstruirem alguma missão” ou de “estarem associado a terroristas ou ao narcotráfico” seria suficiente para os executar.
Nesse sentido, o contrato da Silvercorp é uma ferramenta para realizar um genocídio tal como é definido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI). Constituem genocídio:
“quaisquer dos actos mencionados a seguir, perpetrados com a intenção de destruir total ou parcialmente um grupo nacional, étnico, racial ou religioso como tal: a) Matança de membros do grupo; b) Lesão grave à integridade física ou mental dos membros do grupo; c) Submissão intencional do grupo a condições de existência que acarretarão a sua destruição física, total ou parcial”.
Institucionalização do roubo
A Silvercorp também ofereceu os seus serviços para instalar uma Unidade de Activos, com a qual seriam identificados e sequestrados os bens do país nas mãos do Estado. Segundo o contrato, Guaidó deveria pagar uma taxa de 14% do valor real do bem “recuperado”.
Porém, o jargão financeiro e legalista que procuram dar à redacção desta cláusula não consegue encobrir que estavam a autorizar uma mega operação de tráfico de bens culturais, própria dos grupos mercenários e condenada pelas resoluções das Nações Unidas.
Do mesmo modo, conforme consta no contrato, a Silvercorp assumiria as rédeas do Estado venezuelano ao ser-lhe facultada a possibilidade de realizar actividades policiais, moldar a legislação para eliminar o chavismo e autorizar manobras militares contra a população civil e as estruturas de governo acusadas de “colaborar” com “forças hostis”. Por essa via, seria autorizado o uso de minas anti-pessoais e o recurso a operações armadas de grande envergadura directamente contra instituições públicas, estruturas da FANB e sedes do Governo Bolivariano onde sejam cometidos os “delitos” previamente definidos por Goudreau.
Embora a operação seja caracterizada pelo menosprezo da capacidade de resistência do chavismo, é importante destacar que o contrato em si estabelece as perspectivas a partir da situação na Venezuela após a eliminação de Maduro. É uma declaração de propósitos.
O “modelo de Estado” projectado no contrato é perigosamente similar ao de “Estado Livre Associado” através do qual os Estados Unidos justificaram a sua ocupação militar e política das Filipinas após a guerra com o Império Espanhol sobre o domínio colonial do país. Também é escandalosa a semelhança com a Emenda Platt aplicada sobre Cuba no início do século XX e o estatuto colonial actual de Porto Rico.
O objectivo é construir um regime militar de ocupação com características anexionistas.
As ideias que moldaram o contrato estabelecem que a Venezuela perderia o seu estatuto de República soberana para se transformar num regime militar, disfarçado de parlamentar, ocupado e dirigido pelos Estados Unidos.
Este esquema está relacionado com o tipo de ocupação norte-americana (falsamente qualificada como “estabilização”) do Iraque.
É importante lembrar que após a intervenção militar Washington designou Paul Bremer (falcão ligado a Dick Cheney e Henry Kissinger) como o seu administrador para o Iraque, transferindo-lhe poderes que estavam no âmbito das competências do governo de Saddam Hussein.
Bremer foi encarregado, como presidente da Autoridade Provisória da Coligação (APC), da “reconstrução do país”, autorizando contratos de petróleo a empresas norte-americanas, facilitando as incursões do exército e criando um novo padrão para perseguir as estruturas de poder então existentes. Os Estados Unidos governavam o país militarizando e expandindo o exaltado modelo colonial britânico.
A gestão neocolonial de Bremer actualizou, segundo o prisma geopolítico dos falcões, o modelo de governança através de um exército de ocupação que conduziria os destinos do país e garantiria o controlo das instituições em benefício das corporações privadas.
Por este motivo, o contrato da Silvercorp estabelece a via do neoliberalismo armado transferindo de forma ilegal as competências de segurança e defesa do país para a empresa de mercenários de Goudreau.
Com estas ferramentas, o país seria empurrado para uma fase de fragmentação, dissolução institucional e “somalização”, onde as grandes corporações poderiam assumir o controlo mediante a contratação de mercenários, de poços de petróleo, campos de gás e minas de ouro devido à anulação do Estado de direito e à destruição do monopólio venezuelano sobre os recursos estratégicos.
As coordenadas actuais do conflito geopolítico também se reflectem nas cláusulas do contrato: a voracidade de um capitalismo em crise, em tempos de pandemia, de guerra com o Estado-nação pelo controlo de maiores taxas de lucro e de exploração.
No capítulo venezuelano desta Terceira Guerra Mundial em ascensão, o documento expõe a pulsão geopolítica para reduzir os obstáculos do Estado em benefício da circulação de capitais líquidos, flexíveis e sem controlo fronteiriço e institucional.
E foi a via armada que Washington seleccionou para precipitar esta operação de reinício constitucional e político da pátria venezuelana.