O LADO OCULTO - Jornal Digital de Informação Internacional | Director: José Goulão

O Lado Oculto é uma publicação livre e independente. As opiniões manifestadas pelos colaboradores não vinculam os membros do Colectivo Redactorial, entidade que define a linha informativa.

Assinar

WASHINGTON CARREGA A EUROPA DE BOMBAS ATÓMICAS

Distribuição de bombas atómicas norte-americanas na Europa. As de Incirlik, na Ásia Menor (Turquia) estão em vias de ser transferidas possivelmente para Itália

2020-01-05

Cálculos divulgados por associações de cientistas revelam que 100 bombas nucleares dos Estados Unidas estão instaladas na Europa. E a confirmar-se a transferência de engenhos desse tipo da Ásia Menor, na Turquia, para território europeu, presumivelmente Itália, dentro em breve haverá 150 bombas atómicas em Estados membros da União Europeia. Claro que não serão precisas tantas para liquidar o planeta e a humanidade, tornando a ameaça das alterações climáticas uma redundância. Mas os Estados Unidos e, pelos vistos, os dirigentes europeus gostam que os povos estejam reféns de estratégias de terror.

Manlio Dinucci, Il Manifesto/O Lado Oculto

Na perspectiva de acontecer uma eventual crise dentro da NATO, os Estados Unidos têm um plano de transferência das suas bombas atómicas instaladas na parte asiática da Turquia. Confirma-se que a base italiana de Aviano seria estrategicamente a melhor para as receber, mas desconhece-se ainda se terá capacidade para o efeito.

A agência italiana Ansa, citando uma declaração do general norte-americano na reserva Chuck Wald numa entrevista à agência Bloomberg em 16 de Novembro, informa:

“Cinquenta cabeças nucleares estarão prestes a ser transferidas da base turca de Incirlik, na Anatólia, para a base da Força Aérea norte-americana (USAF) de Aviano, na região de Friuli Veneza Giulia, porque os Estados Unidos duvidam cada vez mais da fidelidade do presidente turco Erdogan à NATO”.

O facto de a Ansa e alguns jornais falarem no assunto, mesmo com atraso, é ainda assim positivo. Confirma o que vimos documentando há muito tempo. “Parece provável” – escrevíamos em 22 de Outubro (mas a Ansa ignorou então a informação – “que entre as opções consideradas em Washington esteja a transferência de armas nucleares norte-americanas da Turquia para um outro país de maior confiança. Segundo o muito respeitado Boletim dos Cientistas Atómicos (FAS), a base aérea de Aviano pode ser a melhor opção europeia do ponto de vista político, mas provavelmente não terá espaço suficiente para receber todas as armas nucleares de Incirlik. Contudo, o espaço poderá ser conseguido pois já começaram em Aviano os trabalhos de reestruturação para acolher as bombas nucleares B61-12”.

Silêncio tumular

Com base no que foi relatado pela Ansa, o coordenador nacional italiano dos Verdes, Angelo Bonelli, perguntou ao governo de Roma se confirma a informação e pediu-lhe para colocar imediatamente o problema ao Parlamento, uma vez que Itália “poderá ter-se transformado no maior depósito de armas nucleares da Europa e o silêncio do governo italiano é inaceitável”. Na realidade, não é apenas o governo que se cala mas também o próprio Parlamento, onde a questão das armas nucleares norte-americanas em Itália é um tabu. Levantar o assunto significa pôr em discussão a sujeição de Itália aos Estados Unidos. 

Itália continua, deste modo, a ser uma base avançada das forças nucleares dos Estados Unidos. Segundo os cálculos da Federação dos Cientistas Americanos, em cada uma das duas bases italianas e nas bases existentes na Alemanha, na Bélgica e na Holanda estarão actualmente 20 bombas B61, o que representa um total de 100, mais 50 em Incirlik (Turquia). Porém, ninguém pode verificar quantas há realmente. Segundo as estimativas, parece que os Estados Unidos estão prontos a reduzir o número, o que nada tem de tranquilizador. Com efeito, preparam-se para substituí-las pelas novas bombas nucleares B61-12. De um modo diferente das B61, largadas na vertical, as B61-12 dirigem-se para o alvo guiadas por um sistema de satélite; e, por outro lado, têm capacidade para penetrar no subsolo, explodindo em profundidade para destruir os bunkers dos centros de comando. O programa do Pentágono prevê a construção, a partir de 2021, de 500 bombas B61-12, por custos da ordem dos dez mil milhões de dólares. Desconhece-se quantas B61-12 serão armazenadas em Itália e em que bases, provavelmente não apenas em Aviano e Ghedi. De acordo com a informação sobre o projecto publicado pelo Ministério italiano da Defesa, os novos hangares da base de Ghedi poderão acolher 30 caças F-35 com 60 bombas nucleares B61-12, o triplo das actuais B61. 

O regresso dos “euromísseis”

Ao mesmo tempo, os Estados Unidos preparam-se para instalar em Itália e em outros países europeus mísseis nucleares de médio alcance (entre 500 e 5500 quilómetros) baseados em terra, análogos aos euromísseis eliminados pelo Tratado INF assinado em 1987 entre os Estados Unidos e a União Soviética. Depois de terem acusado a Rússia (sem qualquer prova) de o ter violado, os Estados Unidos retiraram-se do tratado e começaram a construir mísseis da categoria proibida: em 18 de Agosto testaram um novo míssil de cruzeiro e em 12 de Dezembro um novo míssil balístico; este último tem capacidade para atingir o alvo em poucos minutos. Simultaneamente reforçaram o “escudo antimísseis” na Europa. Na sua “resposta assimétrica”, a Rússia começou a instalar mísseis hipersónicos que, estando em condições de atingir a velocidade de 33 mil quilómetros por hora e de proceder a manobras, podem ultrapassar seja qual for o “escudo”. 

A situação em que nos encontramos é, por isso, bastante mais perigosa que a demonstrada pela já alarmante notícia da provável transferência de bombas nucleares norte-americanas de Incirlik para Aviano. Nesta situação o que prevalece é o silêncio imposto pelo vasto alinhamento político bipartidário responsável pelo facto de a Itália, um país não nuclear, acolher e estar preparado para utilizar bombas nucleares, violando o Tratado de Não Proliferação que ratificou. Responsabilidade tornada ainda mais grave pelo facto de a Itália, enquanto membro da NATO, se ter recusado a aderir ao Tratado sobre Interdição de Armas Nucleares votado por grande maioria pela Assembleia Geral das Nações Unidas.





fechar
goto top