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ISRAEL QUER MAIS: “CHEGOU A HORA DA CISJORDÂNIA”

Assinatura do reconhecimento da anexação dos Montes Golã por Israel (Susan Walsh, AP)

2019-03-27

Whitney Webb, MintPress; adaptação O Lado Oculto

Logo que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou que tencionava reconhecer unilateralmente a soberania israelita sobre os Montes Golã – território definido internacionalmente como pertencente à Síria – alguns poderosos políticos israelitas começaram a pedir à Casa Branca que reconheça também a soberania de Israel sobre o território palestiniano da Cisjordânia.

Em relação aos Montes Golã, Trump não tardou em passar do anúncio à prática. Depois de, no dia 20 de Março, ter dito que era “hora de os Estados Unidos reconhecerem plenamente a soberania” israelita sobre esse território, o presidente norte-americano assinou a decisão na segunda-feira, 25, na presença do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu. A disposição de Trump para transformar o seu governo numa forma de garantir o reconhecimento “oficial” de terras israelitas – como Jerusalém e agora o Golã – encorajou políticos de Israel, principalmente de extrema-direita, a extravasar o seu velho desejo de tomar outros territórios.

Por favor, podemos ter mais um pouco?

Mal foi conhecido o anúncio de Trump, via Twitter, em relação aos Montes Golã o deputado israelita Belezel Smotrich, um político sénior e vice-presidente do Parlamento, escreveu também no Twitter:

“Durante 52 anos também nós temos feito prosperar a Judeia/Samaria (designação israelita para a Cisjordânia), igualmente com uma importância crítica em termos estratégicos, históricos e de segurança. É hora de a nossa soberania ser reconhecida. Com a ajuda de Deus, é isso que faremos em breve, e esperamos ter também o apoio de Trump”.

A inclusão, no tweet de Smotrich, de alusões à “importância crítica em termos estratégicos, históricos e de segurança” da Cisjordânia relacionou-se com as justificações assumidas por Trump a propósito dos Montes Golã, nas quais invocou as já citadas e ainda “a estabilidade regional”.
Smotrich viveu quase toda a sua vida em colonatos ilegais nos Montes Golã e na Cisjordânia; é conhecido como um dos maiores promotores da anexação da Cisjordânia a partir do Parlamento israelita, o Knesset. É conhecido o seu envolvimento numa proposta de lei sobre a regulamentação governamental de 70 colonatos ilegais e a possibilidade de cidadãos israelitas comprarem lotes de terrenos nas áreas C da Cisjordânia – zonas com presença militar israelita – que correspondem a 60% do território.
Smotrich e os seus aliados políticos do Partido da Pátria Judaica – que integra a coligação governamental dirigida pelo Likud de Netanyahu – têm vindo a pressionar cada vez mais pela anexação da Cisjordânia de uma maneira tão explícita que levou a ONU a alertar em Julho do ano passado:

“Depois de anos concretizando a anexação de facto de grandes áreas da Cisjordânia através da expansão dos colonatos, da criação de zonas militares fechadas e outras medidas, Israel parece estar a aproximar-se da promulgação de legislação que anexará formalmente grandes partes da Cisjordânia”.

Se Donald Trump fará ou não o reconhecimento unilateral da anexação ilegal de outros territórios por Israel – como a Cisjordânia – é ainda uma questão em aberto. Embora se saiba que o maior contribuinte político de Trump, o bilionário sionista Sheldon Adelson, tenha sido fundamental para o reconhecimento de Jerusalém, desconhece-se o seu grau de intervenção na decisão presidencial relacionada com a soberania israelita sobre o Golã.

Petróleo, eleições e “necessidade”

Esta decisão, porém, parece ser uma combinação de uma acção para aumentar as possibilidades de reeleição do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, com os interesses da companhia petrolífera norte-americana Genie Energy, que pretende tirar proveito das grandes reservas de petróleo descobertas em 2015 no Golã. A empresa Aflek, filial israelita da Genie Energy, recebeu de Netanyahu a exclusividade de perfuração nos Montes Golã logo após a descoberta das reservas. No Conselho de Administração têm assento nomes poderosos como Jacob Rothschild, o ex-vice-presidente norte-americano Dick Cheney e o magnata da comunicação Rupert Murdoch, entre outros.
David Friedman, há muito conselheiro de Trump e actual embaixador dos Estados Unidos em Israel, proferiu declarações segundo as quais o presidente norte-americano deve ter em conta as considerações de Smotrich se forem ecoadas por outros políticos israelitas com peso em Washington ou que tenham ligações a Adelson. Logo após a vitória de Trump nas eleições de 2016, Friedman disse que o novo presidente apoiaria a anexação de grande parte da Cisjordânia, ou até da totalidade, se Israel a “considerasse necessária”.

O “acordo do século” e o “destino” de Israel

Desde então, o único hipotético impedimento a uma tal acção de Trump seria o destino a dar ao chamado “acordo do século”, um documento norte-americano e israelita redigido pelo genro de Trump, Jared Kushner, e que supostamente definiria a “paz” entre Israel e os palestinianos. Esse acordo, de que se conhecem apenas versões não oficiais, nunca foi apresentado formalmente e admite-se que nunca venha a sê-lo, porque seria um nado-morto se o presidente norte-americano reconhecesse a Cisjordânia como israelita.
Trump continua a dar mostras da sua disponibilidade para reconhecer a soberania israelita sobre zonas que lhe estão vedadas pelo direito internacional; e é muito claro que os casos de Jerusalém e dos Montes Golã encorajam elementos poderosos do governo de Israel a pressionarem em todas as direcções para expandir o país. Por isso, se Trump incluir a Cisjordânia nestas suas decisões será improvável que os políticos nacionalistas de extrema-direita que estão no governo de Israel se dêem por satisfeitos, tendo em conta as suas ambições sobre a Península do Sinai egípcia, os campos de gás natural offshore do Líbano – como já está a acontecer – e sobre outras áreas do Médio Oriente. O Grande Israel é o limite.



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